Leitura de Bolso

Oi vocês,

No final do ano passado, um juiz determinou que o whatsapp ficasse fora do ar por 48 horas. Nessa época eu estava cobrindo férias de uma estagiária da Rádio Escuta – setor da empresa onde os funcionários precisam monitorar todos os meios de veiculo para a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo – e precisava acompanhar a Rádio Bandeirantes. Nos dia em que ficamos sem whatsapp, todas as emissoras falavam sobre isso, e em um dado momento o âncora deu a dica de um site que incentivava a leitura, e eu corri para conhecer. Hoje vamos falar sobre o Leitura de Bolso.

Criado por Paulo Santos e Julian Vilela o Leitura de Bolso é um site onde você cadastra seu número de celular de recebe diariamente textos literários de rápida leitura. O projeto começou depois de uma pesquisa informar que em 2014, cerca de 70% dos brasileiros não chegavam a ler um único livro.
Os textos são enviados gratuitamente pelo Whatsapp e os sócios contam com a ajuda de autores convidados trazendo ao usuário textos inéditos – ou não – com leitura de no máximo 5 minutos.
Maravilhoso né? Eu me cadastrei no mesmo dia que ouvi e fiquei esperando meus primeiros textos, no próprio site havia um aviso que poderia demorar em receber o primeiro texto e depois de três dias eu já estava recebendo.
De segunda a sexta durante a manhã eu sou contemplada com pequenos textos dos mais diversos estilos para alegrar o dia. Para os viciados em leitura é está na correria essa é uma ótima forma de encaixar a leitura no dia-a-dia.

Como eu disse, para se cadastrar é fácil, só acessar o site e cadastrar o número e aguardar. Todas as informações você encontra no site ou fanpage.

E se ficou curioso/a para saber os estilos de textos recebidos confira o último que recebi:

======Crônica======

Uma chance para o perdão

[Série Novos Autores]

Tempo de leitura

⌛ 5 minutos ⌛

Autor:

Frank de Oliveira

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   A Estrela

   Representa a habilidade de aceitar os próprios erros, buscar o equilíbrio entre o material e as coisas da alma. O universo derrama bênçãos. E a dor se dissipa.
    A cigana me olhou nos olhos. Quantos anos teria?, Pensei. Trinta? Trinta e cinco? Não consegui segurar o olhar. Desviei. Preferi mirar a carta: sete pequenas estrelas, o número 17. A moça nua, a se banhar... Na minha cabeça, não veio uma associação sensual, mas outras, diversas, que nada tinham a ver com aquilo, uma forma de fugir do momento e do olhar felino que a cartomante exibia.
   “Macaco é dezassete”, me dizia minha mãe, com seu sotaque nordestino. Quem diria... Se ainda estivesse viva, como iria reagir ao saber que seu filho, agora um executivo na cidade grande, homem formado, estava indo atrás dessas coisas bobas de mocinha, saber o futuro com a cigana...
   Eu tinha pensado que fosse encontrar uma velha de cabelo desgrenhado, com dente de ouro na frente. Pensava que ela ia ler minha mão. Pelo menos, era o que as ciganas faziam no Nordeste, além de roubar os incautos, lhes tirar o dinheiro, a comida e até os bodes. “Raça ruim”, dizia meu pai. “Chico, abre dos olhos!” Mas aquela cigana era diferente. Moça fina, cara de quem tinha estudado quem sabe universitária... Por que estava ali fazendo aquilo?
   “É meu dom, senhor. Sou assim desde pequena.”
   Observando a carta, notei que todas as estrelinhas tinham oito pontas. Quis saber a razão daquilo.
   “Oito é força, moço, a coragem de aceitar as falhas, os erros. De a pessoa aprender de novo a gostar dela mesma, ainda que tenha cometido muitos erros na vida.”
   Aí ela já estava querendo demais. Como eu ia poder aceitar meus erros antigos? Como aceitar que tivesse ficado parado, naquele dia longínquo, o sol escaldante na lagoa do Monjolo... O grito de João. “Me ajuda, Chico! Tô me afundando!” Por que é que não me jogara também? Teria sido o sol na cabeça? O medo de afundar com ele? Preferi sair gritando.    “Donzinha, Donzinha, socorro.” Donzinha demorou. João não voltou do mundo das águas...
   Como o mundo da mulher derramando água que eu via na carta, num lago que eu não sabia o que queria dizer. Um lago de água azul, diferente da água barrenta que engoliu João para sempre. Que o levou para um lugar de onde não retornaria. E minha vida, depois daquilo... Nunca mais a mesma. Nunca mais brincadeiras, badogue, matar passarinho. O passarinho João estava agora em outras esferas de luz. Esferas de luz?
    “Com a Estrela, a pessoa tem condições de chegar a outras esferas de luz”, falou a ciganinha, linda com seus olhos claros, a renda das roupas, a saia rodada... uma polaquinha, era bem esse tipo... Mas que diferença fazia? Estava claro que era uns bons anos mais nova que eu.
   Continuei ouvindo, mas não estava gostando daquela leitura. Tinha gostado da cigana. Estava bom ficar ali, olhando sua mão muito branca e fina a manusear com destreza as cartas... Porém, não estava achando graça naquela leitura que, em vez de me falar do futuro, me levava para o passado. Um passado que a vida inteira eu procurara esquecer. Esquecer as lágrimas nos olhos de Isabela, despedindo-se de mim na estação. “Você não vai conseguir ser feliz”, dissera ela, com pena no olhar e, ao mesmo tempo, como se rogasse uma praga. E eu não tinha sido mesmo. A casa, as crianças, o lar desfeito. Os filhos. Eles estavam comigo, mas longe de mim. Não me reconheciam. E eu nunca os conhecera.
   “Bem, e afinal o que quer dizer isso?”, perguntei, um tanto irritado. “Aí está dizendo que vou ganhar na loteria?”
   “Sim, talvez na loteria espiritual”, respondeu a jovem. “A Estrela é a carta da harmonia. Ela marca o fim dos conflitos. Aprumar-se, estabilizar-se, ter paz. Uma carta de que o senhor está precisando...”
   “Sim, mas não vim aqui para saber essas coisas. Só quero saber se vou conhecer alguém para ficar comigo. A minha cara-metade”, disse um pouco sarcástico.
   “O senhor não está entendendo. Essa carta traz muito mais do que isso que o senhor quer. Ela vai trazer, sim, amor para sua vida. Mas vai também lhe trazer a cura, a cura dessa culpa, dessa mágoa, que, me desculpe, está morando há muito tempo no seu coração.”
   Caramba, como é que ela podia enxergar aquilo tudo só olhando numa carta de tarô? Ela estava me expondo... E tudo o que eu queria era me divertir um pouco naquele sábado quente, eu que tinha ido ali só por insistência da minha amiga chinesa, só para mostrar a ela como era uma festa cigana, para ela poder contar lá para seus amigos do outro lado do mundo...
   “A Estrela é o perdão, senhor, a chance para o senhor perdoar os outros e se perdoar.”
Que diabos! Aquela mulher não tão moça, mas ainda jovem, me falando coisas como se fosse um pai aconselhando um filho, tão pagã e ao mesmo tempo parecendo o padre dos sermões de quando eu era pequeno...
   “O senhor gostaria de saber mais alguma coisa?”
   Novamente, a voz dela me trouxe de volta. Ela me desarmou. Assim como seus olhos tinham desarmado a minha ironia e a minha descrença.
   “Bem, como eu disse... pode ser muito bom escutar essas suas palavras bonitas. Porém, o que eu queria mesmo era saber se ia conhecer a futura dona do meu coração, a minha alma gêmea, como dizem vocês, esotéricos. Mas muito obrigado de qualquer forma”, falei, estendendo-lhe a mão.
   “Sim, mas vai encontrar”, atalhou ela. “Pode estar bem mais perto do que o senhor pensa”, ela disse, me apertando a mão. E ficou segurando-a, por um tempo que me pareceu infinito. Olhando nos meus olhos...
   Desviei-me para a carta da Estrela, pensando em tudo o que ela tinha me dito, tudo naquela simples carta. Então, voltei meu olhar para os olhos da cigana. E eles ainda estavam lá.

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Espero que tenham gostado da dica e sempre que eu souber de novidades assim, conto para vocês aqui no blog.

Beijinhos,